Ele tinha 84 anos. Autor de 'O Nome da Rosa' deixa
legado em estudos da filosofia da arte, na comunicação e na literatura
PARIS - A Itália, a Europa e o mundo
perderam na noite de ontem uma de suas maiores referências culturais,
artísticas e acadêmicas. Umberto Eco, escritor, ensaísta, linguista e filósofo,
autor de títulos imortais da literatura, como O Nome da Rosa e O Pêndulo de
Foucault, e de ensaios filosóficos como Obra Aberta, Apocalípticos e Integrados
e História da Beleza, faleceu no final da noite, em seu domicílio, aos 84 anos
de idade. Pilar internacional de toda uma disciplina, a Semiologia, que marcou
os estudos de Comunicação no mundo, Eco também deixa um imenso e singular
legado sobre estudos de estética.
Eco foi antes de mais nada um intelectual brilhante e reconhecido por sua obra sobre a estética medieval e sobre a filosofia da arte. Nascido em Alexandria, nas imediações de Turin, em 1932, diplomou-se em Filosofia em 1954 na Universidade de Turin. Sua formação diz muito: discípulo do grande filósofo antifascista Luigi Pareyson, defendeu uma tese de fim de estudos sobre Thomas de Aquino, que seria publicado dois anos mais tarde sobre o nome O Problema Estético em Tomas de Aquino.
Em pouco tempo, seu brilhantismo o tornaria reconhecido em todo o mundo. Depois de publicar O Desenvolvimento da Estética Medieval, em 1959, Eco mudou os rumos da crítica da arte no Século 20 com dois textos fundamentais: Obra Aberta, de 1962, e Apocalípticos e Integrados, de 1964.
Seu maior sucesso foi 'O Nome da Rosa'
Esses livros, somados a A Definição da
Arte e a A Estrutura Ausente, são referências na compreensão da história da
estética, sobretudo no que diz respeito às relações entre a filosofia da arte,
a linguística e a comunicação de massa na segunda metade do século passado.
Para Eco, a estética não pode ser dissociada em diferentes ramos - não há uma
"estética da pintura", ou uma "estética do cinema". Em Obra
Aberta, o autor ajudou a romper com a ideia de que um objeto artístico é algo
acabado, com uma interpretação única e fechada ditada pelo artista. Essa
crítica, de "um novo modo de entender a relação com a obra e sua fruição
por parte do público", seria compartilhada então por nomes como o poeta
concretista Haroldo de Campos.
Ao longo dos anos 1960, Eco se
transformaria em uma referência mundial na Teoria da Comunicação ao se integrar
à chamada Escola Sociológica Europeia, da qual faziam parte nomes como Edgar
Morin, Jean Baudrillard ou Roland Barthes. Esse grupo foi marcado por uma visão
menos negativa sobre os meios de comunicação de massa, dissociando-se das
críticas funcionalistas e da Escola de Frankfurt.
Tido como uma autoridade nos meios
acadêmicos, Eco se transformaria, ele próprio, em um exemplo de fenômeno na
cultura de massa com a publicação de um best seller mundial. Em O Nome da Rosa,
de 1980, fez convergir em uma história de ficção várias de suas áreas de
interesse: a história, a filosofia, a estética medieval e a semiótica. Sucesso
extraordinário de público e crítica, com mais de 17 milhões de livros vendidos,
o thriller policial medieval venceu, entre outros, o Prêmio Médicis de Melhor
Romance estrangeiro em 1982. Em 1986, seu livro foi adaptado para o cinema por
Jean-Jacques Annaud, com Sean Connery e Christian Slater.
RELEMBRE AS PRINCIPAIS OBRAS DE UMBERTO
ECO.
Durante a última semana de novembro de
1327, em um mosteiro franciscano italiano, paira a suspeita de que os monges
estejam cometendo heresias. O frei Guilherme de Baskerville é, então, enviado
para investigar o caso, mas tem sua missão interrompida por excêntricos
assassinatos.
O toque de ironia: sua carreira
tardia de escritor de sucesso só teve início graças à encomenda feita por uma
editora que desejava lançar livros policiais curtos e contemporâneos escritos
por "não-romancistas". Ao entregar o livro, Eco apresentou um romance
de suspense de mais de 500 páginas ambientado na Idade Média.
A carreira de ficcionista continuou em
1988 com O Pêndulo de Foucault e a seguir em 1994, com A Ilha do Dia Anterior,
romances cuja publicação foi esperada em todo o mundo. Em 2015, em seu último
romance, Número Zero, que se passa em 1992, Eco revê a história de seu país a
partir do fim da 2ª Guerra Mundial, destilando sua fina ironia sobre temas como
a máfia, a corrupção e, claro, o jornalismo contemporâneo, alvo de crítica
mordaz. Cínico, seu personagem afirma no curso de uma reunião de redação:
"Seria conveniente, para o prazer de nosso editor, que nós encontrássemos
um meio de lançar sombras de suspeitas sobre esse juiz intrometido. Saiba que
hoje, para responder a uma acusação, não é necessário provar o contrário, basta
deslegitimar o acusador".
Mesmo crítico, Eco jamais abandonou sua
paixão pela informação, pelo jornalismo e pela comunicação - ele havia
começado, em 1955, como assistente em programas culturais da rede de televisão
RAI. Ao longo de sua vida, foi articulista assíduo e leitor inveterado da
imprensa italiana e internacional. Eco se dizia fiel à ideia de Hegel de que
jornais são "a reza cotidiana do homem moderno". Até por admirá-la, o
autor lamentava a recente pulverização da informação nas novas tecnologias e,
sobretudo, a superficialidade de alguns veículos de mídia. "A imprensa
exigente deve aprofundar a atualidade, abrir espaço às ideias", pregou em
entrevista ao jornal Le Monde em maio passado, mostrando absoluta clareza de
raciocínio. Eco sofria de câncer e faleceu às 22h30 de ontem, em sua casa,
segundo a família confirmou ao jornal La Repubblica.
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